"Eu vi quando você me viu,
seus olhos pousaram nos meus num arrepio sutil.
Eu vi,
pois é, eu reparei!
Você me tirou pra dançar
sem nunca sair do lugar
Sem botar os pés no chão,
sem música pra acompanhar.
Foi só por um segundo, todo o tempo do mundo,
e o mundo todo se perdeu ...
Eu vi quando você me viu,
seus olhos buscaram nos meus
o mesmo pecado febril.
Eu vi, pois é, eu reparei,
você me tirou todo o ar pra que eu pudesse respirar.
Eu sei que ninguém percebeu, foi só você e eu.
Foi só por um segundo, todo o tempo do mundo,
e o mundo todo se perdeu...
Foi só por um segundo, todo o tempo do mundo,
e o mundo todo se perdeu ...
Ficou só você e eu."
A música a balançava devagar. Olhos fechados. Cabeça pendida para trás. Taça de vinho na mão direita. Pés descalços. Dançava de um lado para o outro na sala. Rindo do presente, gargalhando do passado. Passando a mão pelos cabelos, agora três anos mais longos. Colocando a mão na cintura, três anos mais marcada.
Aqueles olhos azuis. Como desejou por tanto tempo reencontrá-los. Todo o passado parecia outra vida. O mundo tinha mudado tanto... crise mundial, vestibular, mudança de casa, volta para o casamento, nova separação... Finalmente ali, ambos preparados para terminarem o que começaram.
- Por que não me beija logo? Disse Anna sorrindo levemente.
- Não sei se devo.
- Se não deve, por que está aqui então?
- Para te ver. Acho que não podemos continuar.
E foi assim que os papéis se inverteram. Anna era a mulher segura e decidida, ele o homem trêmulo. De pé mesmo deu-lhe um beijo com gosto de vinho tinto seco e desejo. Talvez até tivesse saudade naquele beijo, mas o desejo era maior.Como o previsto o homem com cara de mau e olhos azuis se derreteu e sucumbiu aos olhos amendoados de cílios longos.
Depois de longo silêncio ele responde a pergunta que ela não ousava se fazer.
- Eu não podia ter feito isso antes. Você é especial de mais para mim, não poderia ser mais uma. Esse é o nosso momento, essa é a nossa hora. Teríamos estragado tudo.
- Não disse nada.
- Mas pensou.
- Poderia ter sido tudo tão diferente.
- Algumas histórias não precisam se repetir. Agora somos dois adultos.
- Está falando da mãe do Henrique?
- É. Com você eu quero ser feliz. Não vou errar. Para isso não podemos ficar perto.
No dia seguinte a despedida. No abraço apertado, tudo o que não deu tempo de falar.
- Se cuida. Depois do carnaval eu volto.
- Você também. O natal é depois do carnaval, aparece antes.
- Está bem.
Se abriu a porta, se abriu o portão – tudo no mais puro silêncio. Ele indo pelo corredor pensando não se sabe pensando em que. Talvez na mesma coisa que ela. Que só dariam certo no tempo daquela música, de tempos em tempos, sem nenhum para sempre.
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