sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Olhares escondidos
Falas sussurradas
Sorrisos que fingem timidez
Corpos que se tocam despropositadamente
A ironia fina é o que nos disfarça
...
...
...

O desejo é mesmo incauto

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008


Lúcia não tinha idéia do que o seu colega de grupo falava. Na verdade nem fazia idéia de quem falava. Às vezes conseguia identificar que era o professor, mas nem isso a fazia fingir interesse. Com a sua blusa levemente avermelhada, seu casaco vermelho, suas unhas berrantemente carmim, jeans claríssimo e seu allstar rosa, que já fora vermelho, que a acompanha desde a sétima série; apenas prestava atenção nas pessoas a sua frente. A cara de desanimo e desinteresse delas parecia contaminá-la e a cada segundo se debruçava mais sobre a carteira escolar da universidade [pelo menos não era verde água como a das escolas, não existe nada pior que essa cor].
O gorducho dormia de boca aberta lá no fundo, Maria era bem mais feia do que aparentava ser e infelizmente as plásticas foram ineficazes. Tudo aquilo a inervava severamente, sua vontade era gritar e sair andando em meio a chuva. As vozes continuavam a falar, falar e falar sobre o assunto mais desinteressante da maneira menos interessante possível. Foi quando um barulho lhe chamou atenção: o barulho do cadarço do Antônio, o nerd de sua turma batendo, no chão ao andar. Aquela cena lhe deu nojo. Antônio, aquela figura branca e esquálida, andando desengonçadamente em direção de Júlia, sua namorada tacanha.
A força maior do barulho sugou sua atenção para a cena bizarra que ocorria ao lado do professor [este falava nervosa e afetadamente discursando sobre a matéria, colocando em termos acadêmicos tudo o que os outros já tinham dito]: o namorico de selinhos e carinhos e todos os inhos ridículos de um casal.
As duas horas pareceram uma eternidade onde cada segundo pareceu uma tortura aos olhos e aos ouvidos de Carmem. O que lhe restou foi submergir em seus pensamentos, ficando lá até que o último indivíduo saísse da sala. Com ela vazia levantou, ainda com vontade de gritar e andar pela chuva, mas se limitou a se certificar que pegou o guada-chuva.

domingo, 14 de dezembro de 2008

.N.Ó.S.N.A.N.U.V.E.M.


Sou disperso
Moro no éter
Ando dissipando
Aromas e sabores
Todas as cores se perpetuam em mim.

Até então tudo era redondo e girava
Sempre meio tonto
Um dia encontrei com canto
Nele então havia um par de olhos
Um par de mãos
Um par de pés
Um par de corpos

Desejosos por prazer
Lívidos de desejo
Prontos para se unirem
E se dissiparem segundos depois

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Anna e Otto


Anna e Otto voltaram àquele lugar que tantas vezes freqüentaram juntos. E mesmo quando acompanhados naquele tempo longínquo pareciam sempre Otto e Anna, somente. Foi bom esse retorno. Otto a olhara com o ardor de início de toda e qualquer paixão, já haviam passado desse momento, agora as coisas estavam mais brandas, mais assentadas, mas não menos conturbadas e não menos forte. O amor é assim mesmo: louco.
Me vê dois açaís completos por favor! Obrigada. E Anna se dirigiu a mesa onde reataram. Tenho certeza que sua alma expandiu para todos os cantos do mundo só por estar ali de novo. Sentou-se e esperou Otto voltar com os band-aids para colocar em seus pés que os sapatos sempre machucavam – ele sempre a salvava com os sapatos.
Ele chegou e tomaram o almoço conversando futilidades comuns que só pessoas como eles conversam. Algumas coisas ditas a fizeram sorrir, algumas possibilidades interessantes nos últimos dias surgiram inesperadamente. Mas isso também lhe trazia medo – e caso o planejado não acontecesse... melhor não pensar nas frustrações agora.O almoço passou depressa, ele riu da revista de filosofia que ela comprara. “Logo com esse título?!” “ Foi isso que me atraiu querido, mas qualquer semelhança entre os fatos é mera coincidência.” Retrucou a jovem .
A confusão na calçada lhes permitia andar mais próximos que o normal. As mãos poderiam se tocar com menos cuidado. Isso agradava, creio, que a ambos. É bom tê-lo por perto, ela quis dizer, mas disse algo mais interessante e que ele nunca tinha ouvido.
É bom retornar aos lugares de origem. É bom ver que as coisas realmente estão como antes, e até melhor. É bom olhar para trás e ver alguém, é melhor olhar para o lado e continuar a ver.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Em resposta

Eu digo e repito: Há momentos que só os clichês dão conta dos ocupar as lacunas. Outra máxima minha [essa uso menos, é muito mais perigosa que a anterior...] é: o mundo é brega, porque as melhores coisas do mundo são bregas. Amor, chocolate, família... nostalgia!
Pior é quando começamos a achar que até as nossas atitudes mais revolucinárias são no fundo uma composição dos dois. Ao ver a foto e te ler, começo achar as minhas unhas demasiadamente vermelhas, meu olhar de fera e a extravagância natural clichê e brega... Acho que essas unhas é o meu lado Natasha, claro, que o salto 15 não sai dos meus pés nunca desde muito tempo! É, tínhamos 12, 13 anos... se a sua memória vai embora não sei o que será! A minha é menor que a de um peixe beta...Sabe, eu pensei que ia levar meus filhos lá pra ver a cola de isopor, e pelo que pude observar o poste que destruiu o cabo de vassoura também se foi. Pelo menos ainda temos o bico-de-pato, a sua agenda, a esquina com o ponto de táxi [espero que não resolvam refazer de fato a cidade]. Ainda temos uma a outra. E quanto a Copacabana, é só vir o mais rápido possível...

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Ela

Ela estava lá. Em pé em frente àquelas escadas sem fim. O vestido era branco, não tão branco quanto ela, que esguia e lânguida se confundia com a paisagem do recinto. Dos apartamentos, que tinham suas porta em mogno e os números em dourado, saíam melodias de músicas francesas, aquele piano e violinos bem característicos. O corrimão negro decididamente não harmonizava com o cenário, a não ser com os cabelos daquela mulher que ainda se encontrava nos pés das escadas.
Não se sabe ao certo o que passava dentro a cabeça dela. Mas o que se encontrava lá foi o bastante para se mover. Os braços foram às costas e desabotoou os 52 botões – um a um, vagarosamente como se cada um fosse um passaro a ser libertado. Acabado isso cruzou os mesmos braços a frente do corpo e a mão direita puxou o ombro esquerdo do vestido. A mão esquerda imitou, retirando do corpo o lado direito do vestido. Por último segurou-o na altura da cintura e levantou uma das pernas para arrancá-lo de vez do corpo. Uma perna de cada vez.
Com o vestido nas mãos colocou-o no chão com a parte rendada voltada para o solo. Apenas de sapato começou a subir. Degrau por degrau. A música continuava, pelo que percebi tocava la vie en rose. Seus pensamentos não passariam a fazer sentido no decorrer do caminho. Apenas seguia um impulso quase que animal.
Lances e lances de escada, a mesma música em todos os apartamentos, parecia que ia encontrar a mesma coisa em qualquer um deles. No entanto subia como se o inestimável a esperasse.
Parou. Olhou para os lados. Não subiu escadas, andou em direção a uma das portas mogno, essa com o número 1502 em dourado. Abriu a porta, não estava trancada, mas também não estava encostada. Entrou e como todo o resto a música tocava e estava vazio. Sem móveis, sem pessoas, apenas a vitrola no chão e as janelas escancaradas por onde entrava o vento.
No quarto como em todo o resto não tinha nada, exceto um vestido cor de carmim e uma fita de cabelo da mesma cor. Ela amarrou os cabelos negros, atando a traça que fizera ao vê-la. Vestiu-se e foi a janela. Agora havia cor, o carmim o branco o negro e o azul. Agora existia vida.

Poema para Dulce Ventania

Não importa se onde moras não tenha árvores
Quase desnecessárias quando estás por perto.
Sua pele morena...
Seus pés descalços sobre o chão
São raízes que não te prendem.
Seus vestidos coloridos, flores de mil cores
Alegram as vielas por onde passas.
A risada repentina, os nomes que chamas nas portas das casas
mais parecem passarinhos que residem nos galhos
Toda a correria para recolher pipas que estancam faz com que a brisa venha visitar os corações empoeirados...

Mas quando colocas sua própria pipa no alto,
é aí, que fazes jus ao teu nome.
Teus olhos se acendem como a favela em noite escura.
Teu sorriso, entretanto, queima tal qual o Sol.
A pipa faz no céu uma ventania danada por conta de seu manejo.
Seca as roupas dos varais, faz voar os chapéus das cabeças das mulheres nas praias. A areia toma a pista, as ondas ficam boas para os surfistas.

E ao ver toda essa confusão
Vocês gargalham.
Você e sua pipa.